POÇO FUNDO, UM DOCE DE LUGAR


por Edson Tavares

Haverá festa em Poço Fundo!

Comício, com a presença de políticos conhecidos.

Camioneiros transportadores de carvão das redondezas e motoristas passando pela vila, cada um a seu destino.

Mascates que comercializavam suas mercadorias em Jataúba e outras cidades da região.

Feirantes que traziam seus produtos para a feira do domingo.

Todos têm um desejo conhecido e um destino certo: provar o delicioso doce da terra, num dos hotéis da localidade.


Povoado de Poço Fundo na década 1960

 O mais antigo local de degustação da iguaria era o hotel de Solteira de Zacarias (Maria Josefa das Virgens), na década de 1940; ficava onde hoje se localiza a Igreja Evangélica Congregacional. Apesar do apelido, era casada, e, quando ficou viúva, vendeu o estabelecimento e migrou para Caruaru, onde faleceu, sendo sepultada no solo natal.

Ainda na mesma década de 40, Maria Tomé (Maria Carolina de Araújo) abriu seu hotel, na Rua Padre Francisco, em frente à Igreja Católica. Era diminuta a vila, nesse tempo, mas os doces já enchiam d’água a boca e de desejo os olhos dos passantes. Até que o estabelecimento foi vendido a Maria Lilia de Moraes, que, juntamente com suas filhas Maria Lilia Barbosa, Claudia Barbosa e Jacira Barbosa, continuaram a cultura da produção de doces. Dona Lilia vendeu o hotel para Irene de João Pina (Irene Emília Barbosa), que, por sua vez, repassou para sua filha, Maria de Ramos.

Nas décadas de 1950 e 1960, Joel Belo, Manoel Quincó e Maria Chapéu abriram barracas na movimentada feira livre de Poço Fundo, para comercializar as famosas cocadas de buga, de facheiro e o quebra-queixo, deliciosa iguaria feita de coco.

Dona Veinha (Olindina Escolástica de Araújo), outra doceira de mão cheia, no final dos anos 1960, também abriu sua barraca de doces na feira. Ela passou seus conhecimentos a sua nora, Carlinda Queiroz Pinto, que deu continuidade à tradição do doce até quando, ao parar, repassou a colher e o tacho para os filhos Neide e Rubens, e para sua nora, Geneilza Queiroz de Lima.

Dona Mariquinha de Josildo (Maria Helena Marinho) é outra prendada doceira de Poço Fundo, que, além do tradicional doce de leite, uma preferência unânime, produz também de coco, mamão, banana e goiaba.

A fama dos doces de Poço Fundo expandiu-se, como a fumaça cheirosa que emana das panelas, ganhando os ares da redondeza, indo longe. No passado, alguns frequentadores dos hotéis ajudaram a formar o conceito do povoado como a Terra do Doce: Raimundo Aragão (ex-prefeito de Santa Cruz), José Elias (pai de José Elias Filho), Alcindo Aragão, Noronha (Fernando Silvestre da Silva, comerciante de tecidos e ex-vice-prefeito), Bilino (Severino Francelino Aragão, ex-vereador), Dadau (Adauto Francelino Aragão, tabelião público), Mariano da Miudeza, Dida de Teonilo Silvestre, Antonio dos Papagaios (e seu motorista Botija), Bruno (que trazia os feirantes em seu caminhão), Bibiu do Caminhão, João Firmino (meu pai, com quem, eu-menino, estive tantas vezes, a provar essas delícias).


Distrito de Poço Fundo nos dias atuais

         No presente, Poço Fundo cheira a doce caseiro, manjar saboroso que, ao mesmo tempo, impulsiona a economia local e identifica esse simpático recanto de nossa Santa Cruz do Capibaribe como um aprazível local de degustação dessas iguarias.

Está servido?

Edson Tavares é Doutor em Literatura e 
Cultura pela UFPB; Mestre em Teoria da Literatura pela UFPE;
 e Professor Efetivo do Departamento de Letras e Artes da UEPB.



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POVOADO DE POÇO FUNDO NO SÉCULO XVIII



Localizado na margem esquerda do rio Capibaribe, Poço Fundo é um distrito do município pernambucano de Santa Cruz do Capibaribe, que fica na região agreste setentrional do estado. Segundo o historiador José Antônio Gonsalves de Mello, o povoado de Poço Fundo já fazia parte do roteiro que ligava o Recife ao Rio São Francisco no Século XVIII. Denominado de “Caminho do Capibaribe”, esse trajeto ia até as nascentes do Rio Capibaribe, e, cortando o território paraibano, atingia a ribeira do Rio Pajeú (atuais municípios pernambucanos de Itapetim e São José do Egito). Ao atingir a ribeira do referido rio se seguia até o Brejo do Gama, de onde cruzava em direção a Cabrobó, à margem do São Francisco.